sábado, 5 de janeiro de 2013

A ARTE/EDUCAÇÃO NO COMPASSO DA DINÂMICA CONTEMPORÂNEA

Marcos Diamantino Quando levamos em conta as pinturas rupestres, consideramos que a visualidade é uma das primeiras linguagens do ser humano. Os desenhos nas cavernas, além de narrativas de um cotidiano ancestral, podem significar os primeiros diálogos entre os homens primitivos como também representar mensagens involuntárias do passado para o mundo contemporâneo. Como se estivéssemos unindo as duas pontas da história, hoje a visualidade volta a ser uma linguagem dominante, comunicando através de um contexto muitas vezes sem texto. Uma dinâmica nos sentidos social e comportamental que deve ser acompanhada pela Arte/Educação. Osinski cita em “Arte, História e Ensino – Uma Trajetória” (pag. 101) que o ensino da Arte no início do século XX conviveu com duas teorias contraditórias: a da livre expressão e a do conhecimento. Se a primeira proposta, em tese, proporciona liberdade de criação, os conteúdos mínimos teriam desprestigiado a disciplina e os professores. Somente nos anos 50, conforme Osinski, buscou-se um equilíbrio entre os dois conceitos. A valorização da bagagem cultural, a partir da Pós-modernidade, tende a ser encarada como condição essencial para o exercício da criatividade. Mesmo com rejeição dessa proposta por parte dos defensores da livre expressão, Arte e conhecimento passaram a andar de mãos dadas. Nos anos 60 foram instituídas as bases da Arte/Educação como disciplina por meio do DBAE (Discipline Based Art Education), que, segundo Osinski, procura “associar o fazer artístico aos conhecimentos históricos e estéticos” (pag. 105). O DBAE defende, ainda segundo Osinski, que “qualquer aluno pode se expressar por meio da Arte, dominar seus conteúdos e usufruir de sua apreciação” (pag. 109). Se há um cânone na Arte/educação, no mundo contemporâneo, é o de ser uma disciplina que deve contemplar a diversidade cultural e, por conta disso, estar sempre em transformação. “Os humanos são seres móveis” segundo conceito no artigo “Questões de Diversidade na Educação e Cultura Visual”, de Ballenge-Morris e Daniel. No artigo, os autores citam que o conceito de diversidade cultural surge em 1960 “como parte do movimento pelos direitos civis para combater o racismo”. Como esse, muitos outros movimentos como o Hippie e o Feminista, além de impactarem esteticamente geraram aspectos conceituais que não poderiam deixar de ser absorvidos pela Arte/Educação. A respeito do Movimento Feminista, Belidson Dias, doutor em Arte/Educação, no artigo “Entre Arte/Educação Multicultural, Cultura Visual e Teoria Queer”, relata que as artistas feministas, nos anos 70, nos EUA e Europa, foram as primeiras a assumirem as representações de gênero e sexualidade. Um movimento que começou pela crítica à ausência de mulheres na História da Arte Universal. No artigo “Seis Anos Celebrando o Pluralismo”, na coletânea “Consonâncias Internacionais”, organizada por Ana Mae Barbosa, F. Graham Chalmers alude para o fato de que é preciso mudar a posição da Arte/Educação Multicultural de celebratória para crítica ou insurgente. Para Chalmers, entre outras coisas, a Arte/Educação Crítica reforça a cultura, desafia o conhecimento dominante e encoraja “discursos perigosos”. Na verdade, a proposta de Chalmers é uma provocação aos educadores no sentido de ajudarem a construir, pela educação multicultural, um poder capaz de promover justiça social. Se em seu trabalho Picasso utilizou máscaras africanas e Van Gogh inspirou-se em gravuras japonesas, esses exemplos de hibridade talvez não sejam suficientes para exemplificar o que seja o multiculturalismo. A Arte/educação deve buscar a interação multicultural com a contemporaneidade procurando de certa forma manter a essência, a estética e o significado de cada cultura. Nos anos 70 muitas propostas novas passaram sob a ponte da Arte/Educação mundial. E no Brasil, com a LDB de 1971, em pleno regime militar, instalou-se no País um conceito frustrante de ensino de Arte. A formação dos professores era limitada através de licenciaturas curtas para que fosse ministrada a disciplina chamada Educação Artística, meramente uma atividade recreativa. Descontentes, arte-educadores iniciaram um movimento surgido da necessidade de discutir conceitualmente o problema da disciplina. Em vários estados foram criadas associações de arte-educadores. Em 1987, por ocasião do I Festival Latino Americano de Arte e Cultura (FLAAC), durante o II Encontro Latino Americano de Arte/Educação, o movimento deu origem à fundação da Federação de Arte Educadores do Brasil. A FAEB passa a ser porta-voz das aspirações dos arte-educadores do País e “da luta pelo direito de acesso à arte e à cultura para todos os cidadãos brasileiros e o fortalecimento e valorização do ensino da Arte”, de acordo com Ivone Mendes Richter, em “História da FAEB”, artigo contido em “Ensino da Arte: Memória e História”, organizado por Ana Mae Barbosa. A partir desse momento, inicia-se uma atuação política que tem participação efetiva nos trabalhos da Constituinte que elaborou a nova Constituição nacional. A luta seguinte foi marcada por discussões para incluir na LDB de 1996 a obrigatoriedade do Ensino de Artes nas escolas, em todos os níveis da educação. A mobilização conseguiu, pelo menos, a permanência da disciplina de Artes nas escolas. No desenrolar dessas lutas, a Arte/Educação agregava novos movimentos e preparava campo para a discussão de questões ligadas à própria dinâmica da contemporaneidade. Entre os novos paradigmas estão os ligados a gênero e sexualidade. No artigo “Acoitamentos: os locais da sexualidade e gênero na Arte/Educação Contemporânea”, Belidson Dias descreve as questões de gênero, sexualidade, censura e moralidade presentes na Arte/Educação e a Educação da Cultura Visual. Segundo o autor, a Arte/Educação hoje é negligente e dissimulada quando o assunto é sexualidade. Para Dias, “no sistema educacional formal, do Ensino Básico ao Superior, há uma insuficiência de discussões formais sobre sexo, gênero, identidade de gênero e sexual e sexualidade, exceto quando esses temas são monopolizados pelos discursos morais, religiosos e médicos do currículo”. Quando esse tema foi colocado no forum de debates dos alunos da disciplina de História da Arte/Educação 2, do Curso de Artes Visuais da UAB-UnB, no 2º. semestre, gerou muitos comentários. Um dos comentários referia-se à proposta do Kit Gay do governo federal para combater a homofobia. O Kit constava (pois não chegou a ser efetivado nas escolas) de três vídeos que mostravam situações envolvendo alunos gays e lésbicas. Uma das participantes do fórum mostrou-se contrária ao Kit por acreditar que apenas ampliaria o preconceito de gênero e defendeu uma abordagem circunstancial da questão e não “forçada” como entendeu ser a proposta do Kit. Belidson Dias, em seu artigo também aponta em seu artigo, como melhor alternativa, uma abordagem natural e pontual da questão da sexualidade na Arte/educação. Outro tema ligado à contemporaneidade da Arte/Educação é apresentado por Belidson Dias no artigo “Entre Arte/Educação Multicultural, Cultura Visual e Teoria Queer”. O autor, com o artigo, busca discutir uma nova questão nos estudos de gênero e sexualidade em práticas educacionais que “promovam a diversidade e a pluralidade”. E discorre sobre a Teoria Queer que é o conjunto teórico a partir de estudos feministas, gays, lésbicas e também heterossexuais. Através dessa base teórica busca-se representar as diversas sexualidades na arte contemporânea. Belidson Dias discute esse olhar Queer mas adverte sobre a carência de estudos profundos sobre o tema nas Artes Visuais. Para Dias “tanto há uma falta de conteúdo e de conhecimento gay ou Queer, quanto de uma forte reação negativa de encontro à experiência queer nos programas de Arte Visual”. O tema na Arte/Educação estaria também cercado de preconceitos, pois o termo queer, erroneamente, é associado a gays e lésbicas. Ao contrário, seriam visões particulares da Arte como a do cineasta Almodóvar, estudado por Belidson, que geralmente explora em suas obras uma masculinidade feminina. Renovar a Arte/Educação (que durante séculos, reproduziu conceitos elitistas e mesmo uma pedagogia voltada a segmentos tradicionais como os da pintura e escultura) é uma necessidade diante dos movimentos contemporâneos e da diversidade própria da atual visualidade como os recursos da virtualidade e os meios alternativos. Assim como o artista contemporâneo se satisfaz com a criatividade, a originalidade, a atitude crítica e a interatividade, é pertinente que a Arte/educação contemporânea acompanhe essas novas experiências proporcionando um rico e atual exercício de ensino/aprendizagem. REFERÊNCIAS: DIAS, Belidson. “Entre Arte/Educação Multicultural, Cultura Visual e Teoria Queer” em Arte/Educação Contemporânea” org. Ana Mae Barbosa DIAS, Belidson. “Acoitamentos: os Locais da Sexualidade e Gênero na Arte/educação Contemporânea” Revista Visualidades – Dossiê Cultural – 2006 CHALMERS, F. Graham. “Celebrando o Pluralismo”. Arte/Educação Contemporânea, org. Ana Mae Barbosa RICHTER, Ivone Mendes. “História da FAEB” em Ensino da Arte – Memória e História org. Ana Mae Barbosa OSINSKI, Dulce. Arte, História e Ensino – Uma Trajetória – Cortez Editora

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