sábado, 5 de janeiro de 2013

AS APARÊNCIAS ENGANAM

Marcos Diamantino
Acostumado aos fóruns das diversas disciplinas do Curso de Licenciatura em Artes Visuais, participei de um debate sobre Educação no Facebook. O enfoque era punição aos alunos indisciplinados. Um amigo postou a notícia de que a diretora de uma escola da rede municipal havia punido alguns alunos que criavam transtornos durante o recreio promovendo brigas. A decisão da diretora foi deixar esses alunos sem o Recreio durante uma semana. Algumas mães protestaram e não enviaram seus filhos à escola. Até a minha entrada nesse fórum do Facebook não houve debate porque todos concordaram com a atitude da diretora incluindo profissionais da educação e pais de alunos, mesmo sem conhecer o caso a fundo. Quando opinei citando que algumas punições não resolvem porque o melhor seria entender a causa do problema para tentar resolvê-lo, passei a ser o alvo das críticas. Fiquei surpreso com a quantidade de educadores que se mostram desiludidos com a profissão e que buscam no castigo (palavra muito usada no fórum) uma forma de restabelecer a disciplina como base para a aplicação de conteúdos. Acossado, tomei em defesa da minha opinião o filme indiano “Somos Todos Diferentes”, dirigido por Aamir Khan, em 2007. Por não saberem que o garoto Ishaan era disléxico, pais e professores entendiam as atitudes dele como preguiça, desinteresse e até indisciplina. Por várias vezes, o garotinho de 8 anos foi punido pelos professores que o expulsavam da sala e até com sofrimento físico, batendo na mão dele com uma régua. A punição maior veio dos pais que o mandaram para um internato, longe do convívio familiar. O garoto só começa a compreender o mundo da leitura e da escrita a partir da ajuda de um professor que descobre o problema de Ishaan. O amigo que havia postado a notícia da punição determinada pela diretora foi o primeiro a aprovar a atitude dela. Contestou minha fala dizendo que o caso da indisciplina dos alunos nada tinha a ver com dislexia. Quando citei o caso do filme, apenas dei um exemplo de uma das muitas possíveis causas para o problema da indisciplina. É claro que existem muitas outras: desestrutura familiar, bullying, trabalho infantil, baixa auto-estima, drogadição, más companhias etc. Punir uma criança que tem um desses problemas é puni-la duas vezes. Tive que rebater muitas outras acusações e percebi que estavam confundindo delinqüência (hoje a sociedade está assustada com os índices alarmantes de violência) com alunos indisciplinados. E fiquei pensando: que orientação, nós, futuros professores, teremos para enfrentar essas situações. Não me arrependo de defender a tolerância e o diálogo em busca de uma solução para um problema. E sempre me lembrarei das lições transmitidas pelo filme “Somos Todos Diferentes”. Em minha cidade há uma educadora que realiza um trabalho de inserção muito grande. Segundo ela, não existe grau de limitação, física ou mental, que justifique a separação de um aluno com deficiência dos alunos das classes consideradas “normais”. Ela trabalha nesse campo há muito tempo e, busca colocar em prática, a Lei das Diretrizes e Bases do ensino no país no que se refere à inclusão. Porém, o que ouço é que os professores também não estão preparados para lidar com esse problema. Isso fica claro na primeira parte do filme em que o garoto Ishaam não conseguiu amparo cognitivo por parte da escola, nem amparo afetivo por parte da família e professores e, tudo isso, devido, principalmente ao despreparo da escola em perceber o problema do aluno. Possivelmente, se o professor Ram Shankar Nikumbh não fosse disléxico também não teria subsídios para perceber o problema. Como a trajetória dele assemelhava-se ao do aluno, usou da sua experiência e do seu esforço de convencimento de todos os responsáveis pelo menino para ter a oportunidade de ajudá-lo. A lição que fica, no entanto, a meu ver, é a necessidade de investigar um problema até, se possível, encontrar a sua causa e depois, trabalhar para reverter a situação. Se o garoto Ishaam fosse levado pelos pais a um profissional que identificasse o problema dele, como a um Psicólogo ou Psiquiatra, talvez a ajuda surgiria antes do menino apresentar grandes dificuldades do aprendizado em algumas disciplinas e antes de ser levado para um internato para ser “disciplinado”. Não que as escolas devam ter atendimento multidisciplinar de apoio como psicólogos, médicos, assistentes sociais, dentistas etc. Mas se a primeira escola tivesse pelo menos um orientador sensível talvez pudesse indicar um atendimento especializado para a família do aluno. Volto ao trabalho da Professora especializada em inserção citada no início e que hoje exerce o papel de coordenadora na Rede Municipal de Ensino da minha cidade. Uma profissional com essa experiência poderia fazer esse trabalho nas escolas, pois reúne capacitação para orientar os demais educadores nos casos que envolvam alunos com deficiência. Sei que hoje os quadros de pessoal nas escolas são outros, mas lembro que no Grupo Escolar em que estudei no final dos anos 60, além dos serviços de Merendeira havia também serviços gratuitos para os alunos de Dentista e Cabeleireiro. Esses profissionais eram contratados da escola. Chego ao final desse relatório preocupado com a necessidade, e possível carência, de conhecimentos transversais e paralelos que possam ajudar o professor em sua missão de não apenas transmitir conteúdos, mas de corrigir trajetórias, no sentido de ajudar em uma formação de pessoas acima de tudo éticas e críticas. Nesse sentido, há mesmo a necessidade de conteúdos que ajudem o professor a lidar, da melhor forma, com o lado comportamental dos alunos, revelando caminhos que possam oferecer condições para a identificação das causas dos problemas e também soluções humanas na resolução deles.

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