quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A ABORDAGEM DO CRISTO CRUCIFICADO NA HISTÓRIA DA ARTE

UAB – UnB

Artes Visuais – Licenciatura

História das Artes Visuais

Trabalho Final

Aluno: Marcos Valério Diamantino





A ABORDAGEM DO CRISTO CRUCIFICADO NA HISTÓRIA DA ARTE



Marcos Valério Diamantino





RESUMO: É óbvio que o tema não se esgota em um ensaio como esse e requer uma pesquisa detalhada sobre a abordagem pictórica e conceitual de um momento crucial na história da humanidade não apenas no campo religioso. O presente trabalho, no entanto, numa rápida análise, pretende mostrar as diferenças do registro de uma mesma cena, a do Cristo Crucificado, na ótica dos pintores em diferentes períodos da história da arte universal.



PALAVRAS CHAVE: Artes Visuais, História das Artes, Cristo Crucificado





O surgimento do Cristianismo, no sentido religioso, ou seja, movimento de “religação” do humano e o divino, com o tempo, ao se institucionalizar, assume outras conotações passando a Igreja a influenciar o poder político, social e econômico nas sociedades em que atingiu a supremacia. Esse poder passou a influenciar também a Arte, com a Igreja transformando-se em mecenato. Se foi marcante no Império Bizantino, no Renascimento, no Românico e no Barroco, essa influência continuou, pelo menos de forma conceitual, a inspirar a produção moderna e contemporânea.

Cimabue (1240 – 1302) e Giotto Di Bondone (1266 – 1337) são pintores representativos de um período em que os motivos cristãos dominavam as artes, mas marca também, segundo o guia 501 Grandes Artistas (Editora Sextante, 2009) “a passagem da tradição bidimensional da Arte Bizantina, para o naturalismo, por meio do interesse na perspectiva e do uso de elementos clássicos, da dramaticidade e da emoção”. A obra “O Crucifixo” (1275) atribuída a Cimabue, embora com características da arte bizantina, como a falta de perspectiva, por exemplo, reflete uma “abordagem naturalista da pintura figurativa, com descrições sutis de músculos, ossos e tendões” (p.13). Alguns historiadores asseguram que Giotto foi discípulo de Cimabue.








“O Crucifixo” (1275), Cimabue, Basílica de São Domenico, Arezzo, Itália



A obra “Crucifixo” (1290), de Giotto, embora semelhante a de Cimabue, abandona as convenções da arte bizantina, ao revelar, pela primeira vez, as formas e a posição de um corpo humano real com musculatura e veias. O uso da luz de Giotto permite um claro-escuro que reforça o conceito de tridimensionalidade. De acordo com Leonardo da Vinci, antes de Giotto, todos os pintores, depois dos romanos, imitavam uns aos outros. “Giotto, depois de muito estudo, ultrapassou não somente os mestres de sua época, mas todos aqueles de muitos séculos passados”, citou Da Vinci.




“O Crucifixo”, (1290) Giotto, Têmpera e ouro sobre madeira (530 x 400 cm), Igreja Sta. Maria Novelle, Florença, Itália

Já no período renascentista, Andrea Mantegna (1431 – 1506), pintor e gravador italiano, mostra em “O Calvário”, a influência que o conceito de beleza Greco-romano imprimiu em sua obra. O drapeado nas roupas de suas figuras é influência forte do período clássico, mas a simetria da composição, a profundidade relativa e os elementos bem delineados são típicos do movimento Renascentista. Mesmo numa composição com muitos elementos, o uso da perspectiva com destaque para as figuras em primeiro plano criam um conjunto equilibrado.




“O Calvário”, (1458), Mantegna, Retábulo de São Zeno, Verona



O mestre renascentista Michelangelo deixou um desenho dentro do tradicional tema do Cristo na cruz. Trata-se do “Cristo Crucificado Vivo” (1530), criado para a poetisa Vittoria Colonna. Michelangelo recorre ao conceito clássico de beleza, a harmonia de todas as partes, e produz um Cristo Crucificado “não com o semblante de morto, como se usa comumente, mas em uma atitude de vivo, com o rosto erguido para o Pai (...) em que se vê aquele corpo abandonado, mas como vivo pela acerbo suplicio voltar a sentir e a se contorcer” (Condivil). Embora seja um desenho, está repleto dos ditames renascentistas: simetria perfeita, delineamento claro da figura, pouca profundidade e dramaticidade. No corpo desse Cristo de Michelangelo pode-se notar a preocupação pela imitação da realidade e de uma visão científica de muitos renascentistas, principalmente de Leonardo da Vinci. O historiador U. Boccioni refere-se à anatomia desenhada por Michelangelo como um “quase puramente arquitetônico”.




“Cristo Crucificado Vivo”, (1530), Michelangelo, Desenho, Museu Britânico, Londres



Porém foi Michelangelo o introdutor do Maneirismo, distorção das figuras em função da intenção do artista, que precedeu divisões na Igreja. O Barroco surge como uma nova linguagem pictórica em apoio à ascensão burguesa. Há uma exaltação maior do fervor religioso e dos sentimentos, traduzida em obras em que o clima é intensamente dramático. Há o predomínio do vertical sobre o horizontal. O artista busca libertar-se das regras do passado. Peter Paul Rubens (1577 – 1640), representante desse período pintou várias cenas do calvário de Cristo, uma dela é o tríptico “Levantamento da Cruz” (1610). A obra está impregnada de características barrocas como a falta de simetria: os corpos são amontoados com equilíbrio precário. Na página 80 de “Rubens: Grandes Mestres” (Editora Abril, 2011) refere-se a “construção em diagonal da cena, dinamicamente comprimida na estrutura central do tríptico, que potencializa o efeito dramático da ação”. Além disso, em muitos pontos os contornos das figuras escondem-se nas sombras. Há, no entanto, uma preocupação de conferir a profundidade ao cenário. A escolha de uma cena não-estereotipada envolve o espectador aumentando o impacto do ato cruel.






“O Levantamento da Cruz”, (1620), Rubens, Óleo sobre madeira, (530 x 400 cm), Museu Louvre, Paris



A pintura do gênero religioso entra em decadência no século XX, seja pela atuação das vanguardas ou pela excessiva pesquisa anterior. Uma das exceções é o trabalho do pintor espanhol surrealista Salvador Dali. Duas de suas obras são importantes para mudar os conceitos tradicionalmente ligados à cena da crucificação, típicas até mesmo no Barroco-colonial. Em “Crucificação (Corpo Hipercúbico)” (1954), Dali reúne elementos do Cubismo de outro espanhol, Pablo Picasso, para criar um cruz tridimensional flutuante. O próprio Cristo não está pregado na cruz, é um Cristo liberto e sem marcas de violência. No blog Iconacional, Washington Luiz Peixoto defende que a obra “liberta a mente dos fiéis da figura de um Cristo padecente, própria da mística medievo-barroca para uma visão cósmica moderna, sem opor-se ao Jesus humano e divino”.






“Crucificação Corpo Hipercúbico” (1954), Salvador Dalí, Óleo sobre tela (194,3 x 123,8 cm), The Metropolitan Museu of Art, New York



Outra obra marcante de Dali é “O Cristo de São João da Cruz” (1951). Destaca-se nessa pintura o ângulo de visão. Cristo é visto de cima para baixo, como se a dor de Jesus estivesse sendo observada por Deus. Do renascimento há o uso da simetria, embora numa composição baseada em triângulo e um círculo. Com essas obras diferenciadas, Dali foi alvo de críticas. “O Cristo de São João da Cruz” chegou a ser danificado por uma tijolada de um observador. Porém, ao que tudo indica, Dali afeito às imagens bizarras e oníricas, manteve o devido respeito ao que representa para os fiéis a figura de Cristo.




“O Cristo de São João da Cruz”, (1951), Salvador Dalí, Óleo sobre tela, (205 x 116 cm)

The Glasgow Art Gallery, Glasgow, Escócia



Como já foi dito, há um referencial extenso acerca desse tema: o Cristo Crucificado. Com poucos exemplos, no entanto, foi possível mostrar que, mesmo um tema cercado de religiosidade, conheceu mudanças no decorrer da história da Arte.



Referências:

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DALI. “Grandes Mestres”, Abril Coleções, 2011

HARGREAVES e VULCÃO. História das Artes 1, UAB-UnB

GIOTTO. “Grandes Mestres”, Abril Coleções”, 2011

FARTHING, Stephen. “501 Grandes Artistas”, Editora Sextante, 2009

MICHELANGELO. “Grandes Mestres”, Abril Coleções, 2011

RUBENS. “Grandes Mestres”, Abril Coleções, 2011

WIKIPEDIA, Imagens

VIEIRA, Washington Luiz Peixoto. http://iconacional.blogspot.com

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