sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

SETE CONTRA TEBAS: A TRAGÉDIA A SERVIÇO DA ARISTOCRACIA

Marcos Diamantino


A peça teatral Sete contra Tebas, de Ésquilo, apresentada pela primeira vez em 467 a.C., faz parte, segundo o site WWW.greciaantiga.org , de uma tetralogia Laio, Édipo, Sete contra Tebas, que são tragédias , e A Esfinge, drama satírico. As quatro peças, sustenta o site, remetem à lenda dos labdácias, família a que, de acordo com a mitologia grega, pertenceu Édipo. O conflito da tragédia estudada é entre os irmãos Etéocles e Polinices, filhos de Édipo. Após descobrirem que eram o resultado da união incestuosa de Édipo, que desposou a própria mãe Jocasta, Etéocles e Polinices desprezaram o pai que foi banido de Tebas. Antes de morrer, Édipo teria lançado uma maldição sobre os dois filhos segundo a qual ambos “se tornariam inimigos e terminariam um matando o outro”. Etéocles e Polinices haviam combinado alternarem-se no trono de Tebas. Etéocles, no entanto, não honrou o compromisso expulsando o irmão da cidade. Polinices uniu-se a exércitos inimigos de Tebas e o cerco que sete exércitos fazem à cidade dominada pelo Rei Etéocles torna-se o tema central da peça de Ésquilo.
Convém ressaltar que, na época em que a peça foi apresentada, a sociedade grega já havia passado da transição do genos arcaico (regido pela família) para a polis clássica (regido pela cidade-estado), conforme apontam Souza e Rocha em “O Teatro e a Democracia na Grécia Antiga” (Revista de História e Estudos Culturais). São, segundo os autores, “transformações na forma de viver e de administrar a comunidade”. Antigos preceitos religiosos que norteavam a vida do homem e colaboravam na organização social foram abandonados. Os tempos homéricos, numa referência a Homero (Séc. XII e IX a.C), suposto autor de Ilíada e Odisséia, já não satisfaziam aos anseios do povo grego. Surge então a tragédia com sua “forma educativa, adotada pelos legisladores da cidade-estado como instrumento para ajudar o cidadão a viver e a administrar a polis”.
Sete contra Tebas é uma peça exemplar da tragédia ao manter o determinismo dramático desse gênero teatral grego. Marcus Motta (UAB-UnB), em sua análise de textos teatrais mostra que características da tragédia são a impossibilidade de acordo e a irreversibilidade do destino das personagens. Na tragédia grega, os deuses definem o destino dos homens. No conteúdo temático, Sete contra Tebas, mantém todas essas características. Etéocles, o protagonista, é o Rei de Tebas, cidade prestes a ser invadida pelos exércitos inimigos, um deles comandado por seu irmão Polinices. Etéocles discursa para a sua população na tentativa de organizar a defesa dos portais de Tebas. Surge então um conflito interno talvez maior que o perigo externo: motivar o próprio povo a defender a cidade. Como reagiria o cidadão? Quem de fato merecia apoio, uma vez que era iminente uma batalha fratricida? E os Deuses? Como suplicar pela ajuda deles se Laio, avô de Etéocles , havia desobedecido os desígnios divinos, assim como Édipo, seu pai e Jocasta, sua mãe. A peça, por inteiro, é uma batalha íntima entre Etéocles e o coro, que, de certa forma, representa o povo de Tebas.
Marcus Mota, destaca que Sete contra Tebas, do ponto de vista estrutural, altera “os parâmetros de composição, realização de espetáculos audiovisuais”. Segundo ele, trata-se de uma obra dramático-musical, sendo concebida “como roteiro de representações que demonstra as opções de Ésquilo no enfrentamento da concepção e realização de peças vinculadas: a tetralogia”. Para o estudioso da tragédia, em Sete contra Tebas, os encontros são verbo-musicais, em que um grupo fala e outro canta. Do ponto de vista do cenário, o texto cuida de levar o público a construir mentalmente a cidadela composta de sete portais que são os vãos entre as estátuas dos deuses citados. O site WWW.greciaantiga.org , no entanto, alega, que em Sete contra Tebas, pela primeira vez, utilizou-se uma pintura como fundo de cenário.
Mas, sem dúvida, um dos pontos altos dessa peça é o texto de Ésquilo. O texto faz com que o leitor se sinta como parte da cidadela prestes a ser invadida. O leitor imagina os portais à sua volta em que, a qualquer momento, podem surgir guerreiros sedentos de sangue. Os sons dos tambores, dos gritos, das lamentações, do tinir dos metais das espadas, são elementos que elevam a tensão do público a cada instante. Sete contra Tebas contém um clima de suspense, pavor e medo, não superado pelas principais obras contemporâneas do gênero.
O mito de Édipo e Jocasta rendeu muitos argumentos na literatura e na dramaturgia universais. Nos anos 80, do século XX, o mito chegou a ser tema de uma telenovela da Rede Globo de Televisão, Mandala, em que o autor mantinha até mesmo os nomes originais das personagens. Naquela época, o mito, levado a um meio de comunicação de massa, a TV, mesmo através de um folhetim, gerou impacto e, de alguma forma, levou à descoberta dos mitos gregos. Se mudou algo na sociedade, não há elementos para afirmar. Mas, a utilização dos mitos gregos naquela telenovela, com certeza, teve um peso dramático e de originalidade, que não acompanhamos nas produções televisivas atuais. É a força do mito.

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